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Farmácias sentem efeito tardio da crise

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2018-05-24 12:00:08

 

 

O mercado de farmácias vive hoje efeitos da crise que atingiu o varejo nos últimos anos. Esse cenário adverso deve afetar o desempenho das empresas ao longo deste ano, segundo executivos das principais redes do país.

Os sinais de que as vendas das farmácias têm desacelerado ficaram mais claros nas últimas semanas, quando os números do primeiro trimestre das grandes cadeias foram publicados ao mercado. A Pague Menos não cresceu de janeiro a março e o grupo RD (Raia Drogasil), apesar de se expandir acima da média, perde ritmo desde o terceiro trimestre de 2017.

As empresas afirmam que os efeitos da recessão chegaram ao setor após a segunda metade do ano passado e se intensificaram em 2018. A resiliência desse segmento conseguiu, de certa forma, “blindá-lo” durante um período, mas a lentidão na retomada da economia, e especialmente, a manutenção das elevadas taxas de desemprego – o segmento é altamente dependente de renda – mudou os hábitos dos consumidores e afetou as vendas.

Ainda compõe esse quadro a acelerada expansão da categoria de medicamentos genéricos, que reduz o tíquete médio nas lojas. “O consumo de genéricos está crescendo muito mais. É algo que já vinha aumentando, mas subiu mais de seis a oito meses para cá. São produtos com preço menor, e não há aumento em volume que consiga compensar a desaceleração na receita total” diz Sergio Mena Barreto, presidente executivo da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma).

De janeiro a abril, a venda de genéricos subiu R$ 16% (em valor) e nos medicamentos em geral, a alta foi de 11,5%. Para efeito de comparação, no ano anterior houve aumento de 14,9% nos genéricos e no mercado farmacêutico, de 13,2%, segundo dados do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma). Ou seja, o genérico “descolou” do resto do mercado neste ano. Genéricos são, em média, 60% mais baratos que os medicamentos de referência, segundo a PróGenéricos, associação do setor.

Outro fator que pesa para as drogarias é o desempenho abaixo do esperado nos segmentos de higiene e beleza. “A gente poderia conseguir algum contrapeso com a venda maior desses produtos. Mas eles não estão reagindo da forma como prevíamos”, diz o presidente da Abrafarma. “O primeiro trimestre foi desastroso. Estamos estimando que o mercado [de farmácias] deverá crescer a mesma taxa de 2017, em torno de 9%, e se ficar mesmo nisso, vamos nos dar por satisfeitos”, disse.

Na avaliação de Luiz Novais, diretor financeiro da Pague Menos, existe um efeito do aumento das taxas de desemprego, especialmente no Nordeste, regiões onde a concorrência entre as farmácias acirrou-se após 2017 (leia abaixo).

“O consumidor dessa regiões, que perdeu o emprego no ano passado, tentou manter suas compras usando o seguro desemprego e depois, eventualmente, alguma reserva financeira. Mas isso acabou e a farmácia é uma das primeiras que sente esse movimento”, diz.

O setor também identificou um movimento de substituição de gastos, que afeta o mercado, segundo o presidente da Abrafarma. “Muita gente manteve suas compras nas farmácias nos últimos anos, mas agora está voltando a consumir mercadorias que abandonou, e a usar serviços de que abriu mão.

Estão reduzindo gastos nas farmácias para voltar a comprar outros produtos.” O comando da Raia Drogasil, em entrevista ao Valor no início de maio, já havia alertado para o movimento mencionado por Mena Barreto. “Nosso setor é contracíclico. Quando a economia não vai bem, o cliente gasta no essencial e reduz compras de bens duráveis e consumo discricionário. Com a economia retomando, isso se inverte”, disse Eugênio De Zagottis, diretor de planejamento corporativo da Raia Drogasil Na avaliação de Luiz Novais, da Pague Menos, ainda houve o efeito da queda no reajuste dos medicamentos, determinado pelo governo federal, e que tem impacto direto sobre a taxa de expansão da receita. O aumento definido neste ano é de até 2,84%, menor taxa dos últimos 11 anos.

Em relatório sobre o setor enviado a investidores na semana passada, o analista da corretora Brasil Plural, Guilherme Assis, afirmou que as varejistas devem continuar a apresentar resultados “mornos” a curto prazo.

“Em nossa opinião, o crescimento da receita será prejudicado pela queda contínua nos preços médios e pela redução de tíquetes médios, o que deve consequentemente pesar sobre a rentabilidade, mesmo com os maiores volumes gerados pelos planos de expansão [de aberturas de lojas] em andamento”, escreveu Assis.

“É um novo cenário em termos de vendas e concorrência a que o mercado deve ter que se adaptar daqui para frente”, disse Rodrigo Pizzinatto, diretor superintendente da Extrafarma, ao Valor dias atrás. Especialistas ressaltam que o setor ainda se expande de forma mais rápida do que a média varejo brasileiro, apesar do desaquecimento recente. De janeiro a março, enquanto a receita nominal do varejo restrito subiu 4,1%, segundo o IBGE, as farmácias se expandiram 6,2%, de acordo com a Abrafarma.