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Presidente deveria agir contra atos golpistas, diz sócio da Raia Drogasil

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O presidente Jair Bolsonaro (PL) não poderia ter sumido da cena política e deveria estar combatendo os atos golpistas pós-eleição. Essa é a visão de Antonio Carlos Pipponzi, sócio e presidente do conselho da RD, dona das redes de farmácias Raia e Drogasil, e integrante do conselho do IDV (Instituto para o Desenvolvimento do Varejo), entidade que reúne empresas como Magazine Luiza, Riachuelo, Arezzo e Carrefour, além da própria RD.

“Nessa hora, o presidente tem que comparecer, reconhecer a derrota. Ele ainda é o presidente e deveria estar contornando toda essa crise de movimentos golpistas, deveria estar evitando esse tipo de coisa”, afirma, em entrevista exclusiva ao UOL.

Sobre a demora na definição do próximo ministro da Fazenda do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o empresário considera que isso é esperado em um ambiente de tamanha polarização, e não prejudica os planos de investimentos das empresas. Segundo ele, a ansiedade do mercado pela definição do nome não é um problema grave, e a tendência é que o preço das ações na Bolsa se ajuste com o passar do tempo.

 

Leia trechos da entrevista:
UOL – Passado quase um mês do segundo turno da eleição, qual a sua avaliação da situação até aqui?

 

Antonio Carlos Pipponzi – A primeira coisa: é de se estranhar que, num país democrático, a gente tenha um presidente desaparecido. Isso é uma coisa preocupante. Nessa hora, o presidente tem que comparecer, reconhecer a derrota. Ele ainda é o presidente e deveria estar contornando toda essa crise de movimentos golpistas, deveria estar evitando esse tipo de coisa. Com relação à eleição de Lula, eu vejo até aqui, numa eleição tão polarizada como foi, uma preocupação dele em contemplar todos os grupos. Acho que todas as reuniões são exageradas, tem um time aí de quase 300 pessoas [na transição], acho difícil que cheguem a grandes conclusões.

Tenho uma visão de que isso é um movimento de pacificação, porque essa foi uma das promessas do presidente Lula. Sobre a questão que evidentemente é a principal, ligada ao tema do Auxílio Brasil, ou do Bolsa Família, esse movimento teria que acontecer. Foi uma promessa dos dois candidatos, então não há como fugir disso. Para mim, parece meio absurda a tese de [uma PEC que defina gastos além do teto por] quatro anos. Para mim, é um ano, quando muito dois anos.

 

Como vê a demora na definição do ministro da Fazenda?

A gente tem um país superdividido. É logico que qualquer empresário hoje gostaria de ver uma definição, mas é uma situação extremamente atípica. Eu me coloco um pouco no lugar do presidente Lula. Tem que dar esses sinais de compartilhamento de uma solução geral, de uma construção de um ministério que efetivamente atenda ao momento do país, que é de muita divisão. Nós, empresários, queremos também conversar, apresentar propostas, especialmente com relação à reforma tributária.

Mas existe no mercado uma ansiedade pela definição do ministro da Fazenda.

Eu tenho ações negociadas em Bolsa. A longo prazo os ativos se ajustam aos valores adequados. Esse é um momento de muita especulação, a Bolsa subiu quando o presidente Bolsonaro no primeiro turno foi muito bem e subiu quando o Lula ganhou no segundo turno. O mercado é fundamental, é a grande fonte de captação das empresas, mas não acho que o nervosismo do mercado seja um problema grave no momento. É muito importante que a decisão seja bem-feita, e acredito muito que os ativos vão se ajustar com o crescimento que o país terá.

 

O nome de Fernando Haddad como ministro ganhou força nos últimos dias. Como vê essa possibilidade?

É tudo especulação. Uma coisa que o Lula tem é que ele toma para ele todas as grandes decisões. Vai muito pela intuição dele, pela análise de cenário que ele faz. E isso acontece toda vez, quem está trabalhando na transição não é exatamente [quem vai para o ministério], ou quem tem o nome mais especulado não é quem vai ocupar. Pode ser, mas não tenho nenhuma aposta em relação a isso.

 

Como fica esse momento de suspensão para as decisões de negócio, interfere de alguma forma?

Existe um otimismo, projeções que estão em alta, por conta do país que já navega melhor na economia, com uma estabilidade melhor da inflação, eu diria até independente de qual fosse o governo, a própria situação internacional, o posicionamento do país diante da crise da guerra da Ucrânia. Não é exagerado, mas é otimismo. Obviamente, as definições de direcionamento de política vão ser importantes, mas não vejo redução de investimento, nada disso. Na nossa empresa, vamos abrir neste ano 260 farmácias, uma por dia útil.

 

Outro ponto que tem sido motivo de apreensão é o temor de descontrole das contas públicas, por causa da PEC da Transição. Como vê isso?

Esse é um problema real. Mas é um problema que precisa ser discutido, negociado. Não é bom discutir furar o teto de gastos, há de se encontrar soluções para que isso seja por um tempo curto. Na hora em que há mais dinheiro na mão das pessoas, existe uma contrapartida de que a economia cresce. Eu estou há 45 anos no nosso negócio, e sempre ouço dizer que temos que fazer o bolo crescer para depois dividir. Só que o bolo não cresce, então há uma hora em que você tem que dar um pedaço. E tivemos a pandemia, então temos que entender que o problema é.

 

Reprodução
 
É preciso ter mais calma e menos alarmismo?

O mercado ganha com o alarme, ganha com o botão de pânico. Já passei por um monte de planos, essa maturidade vem da nossa experiência. A gente tem que esperar essas definições de ministério e a forma de negociar esse auxílio, que tem que ser dado. Ele foi prometido e é um momento em que ele é necessário. Saímos de uma pandemia, temos muitos jovens que saíram da escola na pandemia. Que nível de crise social podemos ter se deixarmos essas pessoas desamparadas? Não tem bala de prata. O que é importante também é que tenha regras de saída claras. Vamos lembrar que o Bolsa Família tinha, o Auxilio Brasil não tinha.

 

Qual a principal sinalização que o governo precisa dar ao empresariado nesse momento?

A sinalização seria ter uma liderança, independentemente de ser política ou técnica, uma liderança na condução da economia que observe o livre mercado.

Que não despreze políticas sociais, mas que tenha um direcionamento voltado para o país crescer, e o país não vai crescer com o estado desse tamanho, com um regime tributário complexo como está aí, com empresas que já deveriam ter sido privatizadas e que não foram.

Uma sinalização que possa dar segurança jurídica, inclusive, que é fundamental. Hoje temos um presidente que prega as coisas que ele prega. Que segurança jurídica pode ter um país?

Esgotados esses movimentos que ainda estão na rua, isso para mim já é algo importante. O investidor busca estabilidade, mas ele quer olhar também as perspectivas de país. E a única forma de crescer é produzindo.

Nosso potencial é monumental, a gente só perde para a gente mesmo. Mas vão existir dificuldades. A gente sabe que uma parte dos que elegeram Lula não tem essa visão. Isso é um problema a ser vencido. E também não vamos ter o ideal. Tomara que, de zero a dez a gente consiga um sete. O dez não vai ter.

 

O senhor faz parte do conselho do IDV, que defende maior rigor na cobrança de imposto de players estrangeiros, em especial na internet. Como está esse tema?

É uma pauta que está ligada à reforma tributária e ao alargamento de base [de arrecadação]. Estamos aguardando a definição de quem vai liderar a economia para apresentar uma pauta que está focada na melhora do ambiente do país. Vemos muito espaço para desonerar a folha de pagamentos taxando todos, ou taxar marketplaces que vêm de fora e não pagam nem um centavo. Tudo isso são formas de não só aumentar como de não deixar diminuir a arrecadação, e ao mesmo tempo manter a competitividade do varejo.

 

Foto: Reprodução

Fonte: Uol