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Nota Sincofarma SP e Abcfarma: Funcionamento das farmácias em feriados diante da legislação em vigência

Funcionamento das farmácias em feriados diante da legislação em vigência

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Relatório

Considerando a publicação da Portaria MTE 3.665/2023 que alterou a Portaria MTP 671/2021, especificamente o Anexo IV – que dispõe sobre a autorização permanente para o trabalho aos domingos e feriados, excluindo do rol o comércio varejista farmacêutico, o cerne da controvérsia reside na análise sobre a possibilidade do funcionamento das farmácias nos feriados, a despeito de previsão na convenção coletiva do trabalho e lei municipal específica.

 

Parecer

Embora as farmácias, a exemplo de outros segmentos, apresentem o comércio dentro de suas atividades cotidianas, é importante esclarecer que estes estabelecimentos têm especificidades que devem observância e que o distinguem do comércio em geral.

 

A Lei Federal nº 5.991, de 17 de dezembro de 1973, que dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, e dá outras providências, define em seu art. 56 que tais estabelecimentos devem manter o atendimento ininterrupto à comunidade.

 

Trata-se de lei especial que regula a matéria de forma específica, afastando, ao nosso sentir, a incidência do disposto pela Lei Federal nº 10.101, de 19 de dezembro de 2000, que permite o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, desde que autorizado em convenção coletiva de trabalho e observada a legislação municipal.

 

No caso, é notória a ausência na Lei nº 10.101/08, de cláusula expressa de revogação das disposições da Lei nº 5.991/73 sobre o funcionamento, o que nos leva a concluir que o legislador não teve a intenção de abolir a disciplina especial existente para a matéria.

 

Na verdade, seria paradoxal – para não dizer despropositada – a impossibilidade do funcionamento das farmácias nos feriados ou ainda querer condicionar o exercício da atividade mediante autorização em convenção coletiva de trabalho.

 

Tal entendimento desconsideraria a essencialidade da atividade exercida por estes estabelecimentos, diretamente ligada à preservação da vida e da saúde, razão pela deve ser fomentada pelo Estado – e não restringida ou limitada.

 

As farmácias, conforme definido na Lei n. 13.021, de 8 de agosto de 2014, são unidades de prestação de serviços de assistência à saúde, devendo ser entendida como um posto avançado de atenção primária à saúde.

 

Assim, como parte do sistema de saúde, as farmácias desempenham um papel importante na dispensação e fornecimento de medicamentos, administração de medicamentos, incluindo as vacinas e serviços de saúde ao público, de modo que é imprescindível garantir o exercício contínuo destas atividades.

 

Por consequência lógica o papel social atual das farmácias e dos farmacêuticos não pode ser equiparado com os realizados pelos demais comércios (registre-se, que possuem grande relevância) não sendo razoável, portanto, a sua equiparação a fim de justificar a restrição quanto ao seu pleno funcionamento.

 

Esta linha de entendimento resultará, certamente, em contribuição à efetividade do direito à saúde e à vida, previstos no arts. 196 e 5º, caput, da CF.

 

Ademais, é de se ter presente que a Constituição atribuiu ao Estado, no contexto econômico, o exercício, na forma da lei, além das funções de fiscalização e planejamento, da de incentivo às atividades econômicas (art. 174, CF).

 

Ainda, a necessidade de se dar efetividade a tal positivação de autonomia econômica e de iniciativa é tamanha que o próprio legislador, em lei nacional, qual seja a Lei de nº 13.874/2019, fez instituir a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica.

 

A pluralidade de farmácias e a autodeterminação quanto ao seu funcionamento, dentre outras avaliações possíveis, fazem parte do escopo constitucional da livre iniciativa e do livre exercício de atividade econômica, contemplado pela aludida Lei Federal nº 13.874/2019.


A defesa da restrição, outrossim, é incompatível com um Estado Democrático de Direito, que traz como um de seus fundamentos ‘os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa’ (art. 1º, IV, da CF/88) e como princípios gerais da atividade econômica ‘a livre concorrência’ e a ‘defesa do consumidor’ (art. 170, IV e V, da CF/88).


Conclusão

Ante o exposto, s.m.j. encaminha-se o parecer nos seguintes termos:
No que concerne sobre o funcionamento e atendimento realizado pelas farmácias, há regramento específico, no caso, a Lei Federal nº 5.991, de 17 de dezembro de 1973, que dispõe em seu art. 56 que tais estabelecimentos devem manter o atendimento ininterrupto à população.


A limitação imposta pela Lei Federal nº 10.101, de 19 de dezembro de 2000, não se aplica às farmácias em razão da vigência de lei especial (Lei nº 5.991/73) e diante da natureza destes estabelecimentos, conforme Lei Federal nº 13.021/14, o que os distinguem dos comércios em geral.


A restrição do exercício da atividade ou seu condicionamento às farmácias representa manifesta ofensa ao direito à saúde e à vida, previstos nos arts. 196 e 5º, caput, da CF, visto que tem o potencial de impedir o acesso a medicamentos e a assistência farmacêutica à população.


É o parecer.

Rafael Oliveira Espinhel – OAB-SP nº 250.701

André Bedran Jabr – OAB-SP nº 174.840

 

 

Foto: Reprodução
Fonte: Sincofarma SP e ABCFarma