Pessoas menores de 16 anos serão proibidas de comprar bebidas energéticas na Inglaterra.
Segundo as autoridades locais, o consumo do produto por pessoas nesta faixa etária provoca problemas de saúde, como queda na qualidade de sono e na concentração, além de favorecer os índices de obesidade.
Entenda os riscos:
Energéticos podem causar vários sintomas
Bebidas energéticas reúnem diferentes tipos de estimulantes. “Os principais riscos dos energéticos estão associados à presença de substâncias estimulantes e às quantidades dessas substâncias, especialmente a cafeína, o guaraná, a taurina e o açúcar”, explica Mônica Moretzsohn, membro do Departamento Científico de Nutrologia da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria).
A ingestão desses estimulantes pode gerar uma série de sintomas. “No sistema cardiovascular, [o consumo pode provocar] o aumento da frequência cardíaca —ou taquicardia -, o aumento da pressão arterial, falta de ar e palpitação”, diz a especialista.
Os efeitos do energético podem atingir, também, o trato gastrointestinal, causando refluxo, por exemplo. Em 2022, o médico e youtuber norte-americano Bernard Hsu, que compartilha casos atendidos por ele ou colegas de profissão, contou a história de um homem que bebeu 12 latas de energético em 10 minutos e quase morreu. O paciente, então com 36 anos, desenvolveu uma pancreatite aguda, uma inflamação que acomete o pâncreas, órgão do trato digestório que fica atrás do estômago, próximo das alças intestinais.
O pH deste tipo de bebida pode prejudicar até mesmo os dentes. “Devido ao pH ácido, pode haver a erosão do esmalte dentário, além de cáries [devido aos carboidratos]”, diz a médica. A depender do produto, estes carboidratos também podem facilitar o ganho de peso do consumidor.
Produto representa risco ainda maior para jovens
A mistura de energético com bebidas alcoólicas, como vodca ou uísque, é muito comum entre os adolescentes. “Um antagoniza o efeito do outro”, diz Mônica. “Estudos indicam que jovens que consomem energéticos têm maior propensão a consumir álcool, tabaco e outras drogas.”
O álcool é um depressor do sistema nervoso, e o energético, estimulante. Então, o energético pode mascarar os efeitos da embriaguez do álcool, fazendo com que a pessoa se sinta menos alcoolizada e beba mais –aumentando o risco de consumir maior quantidade de álcool e, consequentemente, de uma intoxicação alcoólica.
Mônica Moretzsohn, pediatra e membro da ABP.
Para atrair este público, bebidas energéticas oferecem versões tradicionais e com sabores variados. “São palatáveis, pela presença do carboidrato”, diz Mônica. “São bebidas que têm um apelo muito grande para crianças e adolescentes. A propaganda que envolve a venda desses produtos coloca essas bebidas como um bom estimulante, para foco, força e disposição, sem orientar quanto ao problema no consumo abusivo”, alerta a pediatra.
A cafeína dos energéticos pode desencadear distúrbios de comportamento, como irritabilidade, nervosismo e ansiedade. Segundo Mônica, quadros de ansiedade e insônia podem se desenvolver em jovens com alta ingestão deste tipo de produto. “Isso acaba comprometendo o rendimento escolar, interferindo no aprendizado e no desenvolvimento neurocognitivo.”
No Brasil, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância) indica uma quantidade máxima diária de cafeína para adultos. Segundo a RDC (Resolução de Diretoria Colegiada) 243/2018, o limite de consumo para este público é de 400 miligramas por dia, sendo 200 por porção.
Para crianças e adolescentes, no entanto, não há uma diretriz que determine um valor máximo. “A Sociedade Brasileira de Pediatria e a Academia Americana de Pediatria recomendam evitar o consumo de cafeína por menores de 12 anos”, explica a pediatra. Já acima dos 12 anos, o recomendado é não extrapolar o limite de 100 miligramas por dia da substância. Em apenas uma lata de energético de 250 ml, por exemplo, a concentração de cafeína pode atingir 80 miligramas.
Segundo Mônica, não existe limites seguros para crianças e adolescentes em relação aos energéticos. “Tanto o consumo diário, mesmo que em menor quantidade, quanto um consumo maior de uma vez, mesmo que esporadicamente, podem ser deletérios [prejudiciais] à saúde, então nenhum tipo de consumo é indicado”, diz.
Uma quantidade maior de energético aumenta o risco de efeitos colaterais, e o consumo regular, mesmo que não seja excessivo, está associado à dependência e outras manifestações clínicas.
Mônica Moretzsohn
O que aconteceu na Inglaterra
Energéticos vêm sendo alvo de críticas no país devido a seus ingredientes. A concentração de cafeína é um dos principais motivos de preocupação. “Como podemos esperar que as crianças tenham um bom desempenho escolar se consomem [uma quantidade de cafeína] equivalente a um expresso duplo diariamente?”, disse Wes Streeting, secretário de saúde do Reino Unido, ao jornal The Guardian. Ainda segundo Streeting, versões de energéticos com alto teor de açúcar elevam os riscos aos dentes e contribuem para a obesidade.
Com a medida, o comércio não poderá vender este tipo de bebida a menores de 16 anos. Lojas, cafés, restaurantes, sites e até mesmo máquinas de venda automática serão proibidos de vender energéticos com mais de 150 miligramas de cafeína por litro para consumidores dessa faixa etária. Segundo o The Guardian, produtos como chá, café e refrigerantes com menor teor de cafeína não serão afetados.
A proibição faz parte de uma série de medidas anunciadas em manifesto do Partido Trabalhista no ano passado. Liderado pelo atual primeiro-ministro Keir Starmer, o partido alega que o país enfrenta “uma crise de obesidade infantil”. Além da restrição voltada às bebidas energéticas, as autoridades se dizem comprometidas em proibir a publicidade da chamada “junk food” para crianças. A medida será oficializada por meio de legislação secundária e, segundo o The Guardian, ainda não há uma data definida para que a proibição passe a valer em território nacional.