No Brasil, a logística reversa de medicamentos abrange os remédios domiciliares de uso humano, vencidos ou em desuso, e suas embalagens.
Em 2024, o mercado farmacêutico brasileiro alcançou um faturamento de R$ 160,7 bilhões, de acordo com a 8ª edição do Anuário Estatístico do Mercado Farmacêutico, divulgada pela Secretaria Executiva da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Mas será que os brasileiros sabem como descartar corretamente os restos dos medicamentos que compraram?
O termo “logística reversa” significa que o medicamento descartado pelos consumidores terá seu fluxo invertido, retornando ao longo da cadeia de produção e distribuição para um descarte final ambientalmente adequado. No Brasil, no caso de medicamentos, a logística reversa abrange os remédios domiciliares de uso humano, vencidos ou em desuso, além de suas embalagens.
O farmacêutico Juan Carlos Becerra Ligos, coordenador do setor de Assuntos Regulatórios do Sincofarma, e coordenador do Grupo Técnico de Trabalho de Logística Reversa, Resíduos e Gestão Ambiental do Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP), explicou ao Terra que a prática correta deve começar na residência, com a separação desses resíduos.
“Se os medicamentos não forem separados adequadamente, podem acabar no lixo comum ou na reciclagem, tendo uma destinação incorreta que prejudica o meio ambiente e a população mais vulnerável. É preciso levar esses resíduos até um ponto de coleta, que são as farmácias e drogarias. Não são todas, mas temos mais de 6.000 pontos de coleta no Brasil”, explica.
De acordo com ele, além dos medicamentos, as embalagens em que são armazenados devem ser entregues às farmácias, como cartelas de pílulas e comprimidos, garrafas de xarope, inclusive os copinhos e seringas medidores, bulas e cartuchos — embalagem secundária, ou seja, a caixa de papelão que envolve a embalagem primária. “É importante que o consumidor rasgue a bula e o cartucho antes do descarte, para evitar desvio e possíveis falsificações de medicamentos”, diz o farmacêutico.
Devido ao risco ocupacional, materiais cortantes ou pontiagudos, como agulhas, não devem ser levados às farmácias. Eles podem ser descartados nas unidades básicas de saúde, que têm os locais adequados para descarte.
Como encontrar um ponto de coleta
Atualmente, mais de 6.800 pontos de descarte de medicamentos domiciliares estão espalhados pelo Brasil. Todos os locais de coleta estão disponíveis para consulta no site do LogMed, sistema oficial de logística reversa de medicamentos. Você pode encontrar o ponto mais próximo da sua residência clicando aqui.
O risco do descarte inadequado
Juan Carlos alerta que os medicamentos são, em sua essência, produtos químicos, e muitos deles são classificados como perigosos. Por serem majoritariamente hidrossolúveis, ou seja, solúveis em água, tornam-se uma ameaça quando descartados incorretamente em redes de esgoto ou vasos sanitários.
“Na hora que você joga isso em um esgoto, vaso sanitário, esses remédios se dissolvem naquela água e fica praticamente impossível separá-los dessa água”, explica o farmacêutico. A falta de tecnologias economicamente viáveis para remover essas substâncias do meio hídrico, de acordo com ele, amplia o risco de contaminação de rios e oceanos.
Além da poluição da água, o descarte inadequado em lixo comum ou aterros não preparados contamina o solo e o ar. “Você contamina tudo, desde os rios e os oceanos até a terra e o ar. Esses produtos químicos podem ser absorvidos por organismos vivos, inserindo-se na cadeia alimentar e afetando ecossistemas inteiros, desde microrganismos até peixes e crustáceos, com grandes danos à biodiversidade e à saúde humana”, afirma o coordenador.
Outro risco grave destacado pelo especialista é o social. “Quando a pessoa joga um medicamento desses no lixo comum, isso vai para catadores, que podem reutilizá-los, expondo-se a doses inadequadas, princípios ativos degradados ou interações perigosas. Ou seja, acaba também pondo em risco a saúde da população mais vulnerável”, destaca.
Qual o destino final dos medicamentos?
De acordo com o Decreto nº 10.388/2020, que regulamenta a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), os medicamentos vencidos ou em desuso descartados pelos consumidores em farmácias com coletores são retirados por distribuidoras e devolvidos aos fabricantes e importadores. Estes, por sua vez, são responsáveis por encaminhá-los para destinação final ambientalmente adequada, como incineração, coprocessamento ou aterros sanitários de classe I, devidamente homologados pelas autoridades ambientais.
“Os consumidores têm papel essencial para garantir o descarte adequado dos medicamentos e suas embalagens. É preciso que todos tenham essa consciência. Os resíduos não saem do nosso planeta, só mudam de CEP. Isso significa que todo produto descartado de forma inadequada permanece no ambiente, afetando ecossistemas inteiros. No caso de medicamentos, que são compostos químicos potencialmente perigosos, o risco é ainda maior devido à sua capacidade de se espalhar e persistir na natureza”, destaca Juan.
O especialista ainda acrescenta que tratar do tema sustentabilidade é pensar sobre responsabilidade com o futuro. “Sustentabilidade é você usar os recursos que tem agora e deixar para o próximo. Nós temos que deixar um planeta melhor e mais rico do que a gente está recebendo para as futuras gerações”, finaliza ele.