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Pele escura: um desafio de crescimento que o setor de beleza precisa vencer

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Embora seja frequentemente ignorada pelas marcas e receba pouca atenção do mercado de cosméticos, a pele escura, com suas características próprias, constitui um campo importante de inovação e crescimento para o setor de beleza.

 

Segundo Pascale Brousse, fundadora da agência Trend Sourcing e autora de um recente estudo sobre a inclusão de peles negras e pardas na oferta mundial de cosméticos, está mais do que na hora de uma mudança de paradigma.

 

Com o impulso da dinâmica demográfica mundial e do protagonismo da população jovem, a oferta de produtos para a pele escura constitui atualmente um fator importante de crescimento para a indústria de cosméticos. Pascale Brousse, ressalta que, nos Estados Unidos, o chamado global black beauty market vem crescendo 14,2% ao ano desde 2024, como informa o relatório Custom Market Insight, que prevê a continuação dessa tendência até pelo menos 2033.

 

As pessoas afro-americanas formam atualmente 14,4% da população dos Estados Unidos, segundo estatísticas publicadas pela Nielsen IQ, o que significa um aumento de 32% desde 2000. Metade dessa população tem menos de 30 anos e faz parte de uma geração conectada e à frente de muitas tendências, que não hesita em redefinir os padrões de beleza.

 

“Além disso, a previsão é que o continente africano seja o berço de 42% das crianças que nascerem no planeta até 2050. A Índia, por exemplo, já tem 600 milhões de jovens com menos de 25 anos. A França proíbe estatísticas baseadas em critérios étnicos, mas, graças a exames para a detecção do gene da drepanocitose, sabe-se que 40% das crianças que nasceram em 2021 em Paris e subúrbios descendem de mãe e/ou pai originário da África ou do Oriente Médio. Podemos imaginar as mudanças que isso acarretará para a sociedade e a importância de levar em conta a totalidade da população”, afirma a autora do estudo.

 

Apesar de terem menor poder aquisitivo em comparação com a média da população, esses consumidores compram mais, investindo quantias maiores em produtos de beleza.

 

As mulheres negras consomem sete vezes mais produtos de beleza para o corpo e para o cuidado do cabelo. Nos Estados Unidos, o consumidor negro geralmente compra na Amazon e no Walmart, onde ele costuma encontrar produtos adaptados às suas necessidades. Recentemente, o TikTok Shop passou também a atrair esse tipo de cliente, em especial os mais jovens”, continua a especialista.

 

 

Um leque de características a levar em conta

Como resposta a essa demanda, a oferta deve ser desenvolvida com base em necessidades específicas. No entanto, as fórmulas ainda estão a anos-luz da realidade científica que caracteriza os diversos tons de pele.

 

“No âmbito desse estudo, entrevistei diversos especialistas, que confirmaram: na maioria das vezes, o ponto de partida é o conhecimento que se tem da pele branca, e isso não funciona! Para desenvolver produtos realmente eficazes, seria preciso trabalhar a partir das características específicas da pele escura e em seguida adaptar as fórmulas a outros fotótipos de pele. A situação lembra a época em que surgiu a clean beauty, há cerca de quinze anos, quando as marcas tentavam tornar seus produtos mais ecológicos mediante a mera substituição de um ingrediente por outro”, explica Pascale Brousse.

 

“A pele negra ou parda não é um tecido cutâneo diferente, mas uma pele que se situa em um grau mais alto no sistema pigmentar”, ressalta a especialista. A densidade de melanina influencia a reatividade da pele. A inflamação se traduz em manchas de hiperpigmentação, principal motivo de consulta dermatológica em pacientes com pele escura.

 

A hidratação é outro fator crucial. “A pele do rosto costuma ser mais oleosa, mas a do corpo é mais seca”, diz ela. “Isso requer fórmulas diferentes, ricas em cerâmidas, mas não comedogênicas”.

 

Nos segmentos de maquiagem e cuidados capilares, as diferenças são consideráveis. Os produtos destinados a cabelos texturizados nem sempre convêm aos cabelos crespos. Da mesma forma, as bases faciais devem ser adaptadas aos subtons essenciais, os pós devem ser mais transparentes etc.

 

Repensar padrões

A metodologia científica vem se apoiando, desde a década de 1970, na escala de Fitzpatrick, que segmenta a pele em seis fotótipos, do mais claro ao mais escuro. Hoje, essa referência tem mostrado seus limites. O Google recentemente colaborou com o Dr. Monk, da Universidade de Harvard, para definir uma nova escala, que recebeu o nome de Monk Skin Tone (MST). Formada por dez nuances, ela busca refletir melhor a diversidade cromática da pele humana.

 

“Essas metodologias não são perfeitas. Na verdade, não existe um consenso científico sobre a classificação dos tons de pele. É importante também ressaltar a dermatologia migratória, ramo que estuda o impacto das mudanças climáticas na pele. Quando um indivíduo que vivia num clima quente e úmido passa a viver numa região com clima diferente, sua pele geralmente fica mais seca e reativa. Com isso, ele passa a ter necessidades cosméticas também diferentes”, explica Pascale Brousse.

 

Do argumento de inclusão à realidade científica

Com esse estudo, a autora incentiva as marcas a irem além do simples discurso inclusivo e a orientarem seus esforços em favor de uma estratégia científica e de marketing mais adaptada, desenvolvendo pesquisas de base e mobilizando, quem sabe, recursos inexplorados da farmacopeia.

 

“Os ingredientes que constituem a farmacopeia africana, como o quiabo – planta extraordinária que já vem sendo usada para hidratar e fortalecer os cabelos – ou o baobá, a nigela e muitos outros insumos, abrem novas perspectivas que hoje ainda são pouco exploradas por falta de pesquisa e investimento. Há um rico manancial de saberes regionais que precisam ser valorizados”, afirma Pascale Brousse.

 

Embora estejam surgindo iniciativas positivas, ainda precisamos vencer o desafio de integrar a realidade da pele negra ou parda aos projetos de inovação do setor de cosméticos.

 

Fonte: Brazil Beauty News
Foto: Reprodução