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Audição de mais de 1 bilhão de jovens está ameaçada, alerta OMS

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2019-02-22 12:00:08

 

Entidades apresentam novos padrões para que empresas possam controlar volume de som em celulares e aparelhos.

 

Mais de 1 bilhão de jovens no mundo corre o risco de desenvolver problemas auditivos diante de uma exposição prolongada e excessiva a sons em volume alto, principalmente por meio de fones de ouvido. O alerta é da Organização Mundial da Saúde (OMS) que, nesta semana, publica novos padrões para a produção de produtos tecnológicos que, segundo a entidade, estão contribuindo para a atual situação. A estimativa é de que o risco atinge 50% da população entre 12 e 35 anos de idade.

Em um projeto que colocou lado à lado a OMS e a União Internacional de Telecomunicações, especialistas do setor de saúde e de tecnologia estabeleceram parâmetros a serem seguidos pela indústria, incluindo a de celulares.

Hoje, cerca de 5% da população mundial, cerca de 466 milhões de pessoas, tem problemas auditivos, com um custo anual para a economia global de US$ 750 bilhões. Até 2050, a estimativa é de que esse número supere a marca de 900 milhões de pessoas.

Na avaliação da OMS, porém, chegou o momento de que padrões sejam adotados. A recomendação é para que as empresas passem a colocar opções de limite automático de volume nos aparelhos.

Uma espécie de crédito de som seria criado por semana e, caso o usuário atinja 100%, haveria algum tipo de bloqueio na capacidade de elevar o som.

Em um primeiro momento, uma mensagem apareceria ao usuário para que reduza o som. Caso a mensagem seja ignorada, o volume seria congelado automaticamente em um patamar considerado como adequado.

Fones de ouvido

O celular do designer Yago Lucri de Santana, de 21 anos, até mostra quando o volume está acima do adequado, mas não costuma se importar com a informação. “Ignoro. Aperto o ‘ok’ e aumento o volume.”

Ele conta que a primeira coisa que faz ao acordar é colocar o fone de ouvido, que o acompanha no trajeto até o trabalho e durante o expediente. “Não gosto do barulho ambiente. O fone tranquiliza e gosto muito de ouvir música.”

Ele conta que, por estar sempre com o fone de ouvido, os colegas de trabalho precisam tocar nele para chamar sua atenção. Em casa, não é diferente. “Moro com a minha mãe e minha irmã. Elas se incomodavam bastante, mas acabaram se acostumando. Antes, minha mãe gritava para falar comigo. Agora, ela vai até o meu quarto.”

Santana começou a fazer o uso frequente do equipamento em 2017, quando utilizava um modelo intra-auricular. Incomodado, trocou por um modelo de concha há cerca de um ano. “Doía o ouvido, porque machuca muito depois de um tempo de uso.”

O novo padrão também recomenda o controle parental sobre aparelhos utilizados por menores. “É recomendado que os aparelhos ofereçam uma opção em que o nível máximo de som possa ser fixado e bloqueado já ao estabelecer os dados do usuário, inclusive por meio de um código secreto”, indicou a OMS.

“Isso permitiria que os pais possam estabelecer o limite máximo de som que um aparelho pode gerar para uma criança e que esse menor não o possa modificar”, completou.

A outra recomendação é para que os aparelhos possam medir, por meio de softwares, a exposição do usuário ao som e que possam calcular o percentual do dia diante desse risco. “Os aparelhos pessoais de som devem incluir um software que monitore o nível e duração da exposição do usuário ao som”, explicou a OMS.

O usuário então poderia selecionar duas opções para que o aparelho indique quais são os usos “seguros” do nível de música. Para adultos, se o nível de som ficar abaixo dos 80 decibéis, é possível ouvir música em segurança por até 40 horas por semana. Qualquer nível acima dessas taxas seria alvo de um alerta e mesmo de uma interrupção do uso do som nos aparelhos.

A segunda opção seria o uso desses aparelhos por menores. O mesmo controle ocorreria, mas com um índice de 75 decibéis. De acordo com os padrões, se uma criança ouvir música acima de 100 decibéis, qualquer duração acima de 6 minutos por semana já seria perigoso para sua audição.

Ao utilizar fones de ouvido, o ideal é que o volume seja ajustado em menos de 60% do máximo que pode ser alcançado. O equipamento deve estar ajustado e, se possível, ter cancelamento de ruído, como os fones que cobrem toda a orelha do usuário.

“Hoje, não temos exatamente como saber se estamos ouvindo a música num volume adequado ou não. É como dirigir um carro em uma estrada sem os ponteiros de velocidade nos carros”, disse Shelly Chadha, especialista da OMS. “O que estamos recomendando é construir um ponteiro de velocidade para esse som”.

Segundo ela, são os governos que precisam estabelecer os padrões e, assim, exigir que os produtos possam seguir as recomendações. Na Europa, alguns países já adotam exigências de que colocar cores nos volumes de celulares, mostrando em vermelho um eventual excesso. Mas isso, na avaliação da OMS, não seria suficiente.

“Dado que temos o ‘know-how’ tecnológico para impedir a perda auditiva, não podemos simplesmente permitir que crianças sofram com isso ao escutar música”, disse Tedros Ghebreyesus, diretor-executivo da OMS. “Eles precisam entender que, uma vez perdida a audição, ela não retorna”, alertou.

Ao usar o fone de ouvido na rua ou no transporte público, o usuário não tem o impacto do volume alto, pois vai aumentando gradualmente. Assim, a lesão ocorre sem que a pessoa sinta os danos.

“Em ambientes comuns, como o ônibus, o nível de ruído já está no limite, que é de 80 decibéis. A pessoa aumenta o volume por causa do barulho e coloca acima dos limites”, explica o médico otorrinolaringologista Luiz Fernando Manzoni Lorençone, membro titular da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.

De acordo com ele, um dos primeiros sinais de que a audição não vai bem é a dificuldade compreensão. “A pessoa sabe que a outra está falando, mas não consegue entender. Ela entende fonemas parecidos ou confunde (palavras). Isso, principalmente para os jovens, cria bullying.”

Dano irreversível

Segundo o médico otorrinolaringologista Jamal Azzam, o ouvido tem um sistema de controle que permite neutralizar sons intensos. “Mas ele não consegue cortar sons de 100, 120 decibéis. Quando é muito intenso, danifica as células auditivas. Quando o paciente percebe a perda auditiva, é porque ela já evoluiu. É importante saber que todas essas lesões são irreversíveis.”

O ideal seria fazer o uso de modelos que cobrem toda a orelha e com cancelamento de ruídos externos. “Geralmente, as pessoas usam fones de inserção, que nunca vedam totalmente o canal auditivo. Isso vai somar o nível de intensidade sonora do ambiente com o do fone de ouvido.”

Manter o volume baixo e fazer intervalos são orientações da fonoaudióloga Ana Lúcia Durán, da clínica Zambotti e Durán. “A exposição a ruídos já é uma das causas comprovadas de perda de audição. As pessoas não podem usar fone por tempo prolongado. Já existe um processo natural de envelhecimento e, com o tempo, a pessoa vai perdendo determinadas células e perdendo audição.”

Ela diz que a faixa dos 12 aos 20 anos costuma fazer o uso mais inconsciente do equipamento, pois, além da música, esses jovens usam os fones de ouvido em jogos.