Em discussões sobre interpretação da legislação brasileira, atores (especialmente multinacionais) do setor farmacêutico têm se debruçado sobre uma situação jurídica, então denominada pela sua versão anglófona de “skinny label”.
Buscam, ao que parece, desacreditar a solução que vem sendo apresentada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em relação ao assunto. A discussão está em vias de acontecer oficialmente na autarquia, por meio da Consulta Pública 1.137/231 – já iniciada e com prazo final em 6/3/23. Essa tem o objetivo de debater a mitigação da restrição imposta na RDC 47/09 que, até então, determina que as bulas de medicamentos genéricos e similares devem conter as mesmas informações – com algumas exceções.
Entretanto, esta legislação sanitária não contemplou as consequências decorrentes do “fenômeno das patentes de segundo uso”. No caso, não é incomum que titulares de patente sobre tecnologia farmacêutica, posteriormente ao depósito de pedido de patente sobre o composto original, reclamem a proteção de um novo uso sobre o mesmo, então tido por inesperado por este agente econômico. Verificado o preenchimento dos requisitos de patenteabilidade, este novo uso de um composto, mesmo já em domínio público, poderia, em tese, gerar uma nova patente, então referente a este uso.
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Ocorre que, com este novo uso – uso este que se pretende explorar economicamente –, o titular do registro sanitário requer sua alteração para, assim, comercializar o medicamento também com aquela nova reivindicação terapêutica. Entretanto, numa leitura fria da legislação brasileira atual, o medicamento genérico/similar também deverá fazer a mesma alteração – eis que deve seguir tais informações do medicamento referência. Neste cenário, uma vez que o medicamento genérico inclui em sua bula (seguindo a regra fria da lei) o novo uso, iniciam as discussões sobre possível infração.
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Ou seja, a regra como posta hoje pode vir a inviabilizar o programa dos genéricos, acaso o titular do medicamento referência venha a requerer um segundo uso, se a interpretação sobre possível infração prevalecer. Haveria, hoje, insegurança jurídica que tende a, em tese, dificultar a exploração, inclusive, de tecnologias que se encontram em domínio público. Portanto, a proposição da autarquia tende a se apresentar como salutar, na medida em que afasta a insegurança jurídica e impede o indevido enclausuramento de tecnologias já em domínio público. Ressalta-se, por fim, não se cogita que o genérico tenha “direito” ao uso de tecnologia patenteada (i.e., protegido por patente validamente concedida e plenamente eficaz), mas que, naquilo que o privilégio não mais existir, haja sua plena efetivação para benefício do SUS (Sistema Único de Saúde), do paciente, da concorrência etc.