2021-08-18 11:11:36
A recente quebra de patentes de produtos farmacêuticos no Brasil abre um ponto de reflexão para entender como as indústrias farmacêuticas vão conduzir suas novas pesquisas clínicas para o desenvolvimento de novos medicamentos no País.
Como se sabe, em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que o prazo máximo de uma patente para um determinado medicamento seja de 20 anos. Com essa medida, qualquer indústria concorrente pode solicitar o registro de genérico para o fármaco de referência da empresa concorrente. Com isso, uma pergunta fica no ar: quais serão as consequências que essa medida pode trazer ao desenvolvimento de novos medicamentos?
A resposta ainda é incerta, conforme explica a farmacêutica industrial e professora da pós em Assuntos Regulatórios do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Luciana Colli, ao pontuar alguns possíveis impactos que a mudança pode causar.
“Talvez algumas empresas podem não achar o Brasil mais tão atrativo assim, pois elas vão medir uma curva de vida, que a gente chama de o tempo em que o produto fica no mercado. Então, de repente, pode não ser tão atrativo trazer inovação, pois é caríssimo, em ordem de milhões de dólares, trazer produtos inovadores”, explica ela, em entrevista exclusiva à equipe de jornalismo do ICTQ.
Contudo, Luciana ressalta que vê um cenário otimista, ampliando a concorrência no segmento de genéricos no Brasil, pois a quebra de patentes pode favorecer à indústria nacional.
“A medida entrega grandes possibilidades para todo o parque de produção de medicamentos, como, por exemplo, à criação de novas linhas de genéricos. Então, talvez, indústrias que ainda não sejam players de mercado para genéricos podem se encorajar nesse segmento e a gente passe a ter um maior número de competidores na categoria, inclusive também em similares, pois com a quebra de patentes abre-se oportunidades para essa classe”, defende.
Quanto ao mercado profissional da área de pesquisas clínicas, ela destaca que também podem ocorrer impactos positivos, uma vez que até os players não inovadores precisam investir em pesquisa e desenvolvimento (P&D).
Referência x similares x genéricos
Em aula da pós-graduação em Assuntos Regulatórios do ICTQ, Luciana explica que antes da regulamentação dos genéricos no Brasil, em 1999, a principal classe de medicamentos que existia era a de referência, em que os produtos são lançados por uma empresa de forma exclusiva.
Ela lembra que esses medicamentos têm sua eficácia avaliada no seu processo de desenvolvimento que foi feito pela empresa fabricante, em que ao longo das fases de ensaios clínicos a indústria avalia a eficácia e a segurança terapêutica do produto, dando, assim, subsídios para o registro sanitário.
Todo esse processo, como se sabe, envolve custos altíssimos em P&D, além de um longo prazo até que a indústria consiga desenvolver, registrar e lançar seu produto no mercado.
A professora explica que havia também os medicamentos similares, porém, eles não conseguiam entregar a mesma segurança que os fármacos de referência.
“Existia uma insegurança ao usar esses fármacos, pois, não se tinha certeza sobre o quanto tempo e em qual quantidade o paciente teria do medicamento circulante pronto para atuar no seu receptor farmacológico e desencadear a sua função”.
Com isso, a partir dessa insegurança, surgiram os genéricos, promovendo o que a professora clássica como uma “verdadeira revolução” na forma de elaborar dossiês de registros e como avalia-se os medicamentos.
Com os genéricos a indústria começou a usar termos que antes não eram muito comuns dentro de Assuntos Regulatórios e no setor de fabricação de medicamentos. Como, por exemplo, bioequivalência, biodisponibilidade, bioequivalência relativa, bioisenção e classificação biofarmacêutica (saiba mais sobre esses termos aqui).
Em comum, esses termos estão relacionados à segurança e à eficácia que os medicamentos genéricos oferecem em comparação aos produtos de referência.